A moeda, como as relações hierárquicas e de dominação, não é portanto uma invenção moderna: ela já fazia parte de sociedades mais antigas – mais arcaicas, pode-se dizer – do que as civilizações da bacia do Mediterrâneo, do Oriente Próximo, do Extremo Oriente ou da América Central. A circulação de bens valiosos no interior dessas comunidades, e também entre elas, parece ter sido um fato universal, que de certa forma prefigurou a moeda em sua dupla função de meio de pagamento e de conta.
Mas essas funções essenciais ainda não se haviam tornado puramente econômicas naquelas sociedades antigas: permaneciam tributárias do sistema de relações de parentesco, alianças políticas, crenças e cultos que intervinha na renovação das forças de trabalho, organizava a produção e justificava a repartição da riqueza.
A moeda – ou, em tais circunstâncias, a paleomoeda – era um instrumento ativo da vida social. Ela regulava os nascimentos, os casamentos e o luto, servia para declarar a guerra ou estabelecer a paz, compensar os danos físicos ou morais, dialogar com as divindades tutelares da fecundidade ou da morte. Por outro lado, ainda não possibilitava a quitação de uma dívida, a compra de bens ou a aquisição da força de trabalho.
Mas a paleomoeda apresentava características de escassez e inutilidade análogas às de certas formas contemporâneas de moedas, antecipando inclusive a natureza econômica e política das moedas modernas: econômica, porque ela codificava atividades e riquezas como unidades contábeis e prefigurava, com sua uniformização, os atuais meios de pagamento; política, porque expressava, atualizava e reproduzia as relações de poder e hierarquia entre os indivíduos e grupos.