Ghislain Deleplace
Mas foi em torno da análise monetária da sociedade que se desenvolveu o pensamento econômico na Europa do Renascimento. A moeda era então considerada o objeto da riqueza dos comerciantes e, ao mesmo tempo, o atributo do poder dos príncipes. A relação entre príncipes e comerciantes era, na época, o verdadeiro tema da análise monetária – e o fundamento de uma teoria econômica da sociedade.
Esse enfoque sofreu no século XVIII uma mudança radical, confirmada pelas palavras do filósofo inglês David Hume (1711-76): “A moeda propriamente dita não é um dos objetos do comércio, mas apenas o instrumento pelo qual os homens entram em acordo para facilitar a troca de mercadorias. Não é a engrenagem dos negócios, mas o óleo que torna o movimento da engrenagem mais fácil e suave.”
Esse conceito puramente instrumental da moeda é o corolário de uma visão da sociedade em que o mercado desempenha sozinho o papel de regulador. Induz a destituir o príncipe – o Estado – de qualquer função de coordenador entre os agentes privados, pois estes são todos comerciantes, naturalmente ligados uns aos outros nessa “sociedade mercantil” Reduz assim a moeda a um simples véu, que envolve as trocas e deve ser descartado para que se possa analisar a realidade dos fenômenos econômicos. Qualquer tentativa de o Estado gerir a moeda é, portanto, considerada ameaçadora para a harmonia social, cuja fonte natural é atribuída às leis da concorrência.
Essa desmaterialização progressiva do instrumento monetário é então compreendida como uma simplificação das trocas comerciais. Objetos de uso corrente nas comunidades funcionam sucessivamente como moeda – um metal qualquer, ouro ou prata em barras e lingotes, diversos metais, certificados de ouro, cédulas, cheques e cartões de crédito, enquanto não surge a moeda eletrônica. Em conseqüência da desmaterialização, a moeda é emancipada de qualquer objeto que garanta seu valor, para se transformar em puro instrumento de transferência.
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