CARIMBO DE ESCUDETE – Surgimento e uso da marcação

 


Em 1695, existia uma enorme demanda por moedas no meio circulante de um Brasil ainda colonial, foi por motivo de tal demanda que começaram a circular em nosso país as primeiras moedas conhecidas como “coloniais luso-brasileiras”, cunhadas em cobre e prata. A cunhagem das moedas na Colônia era diferenciada daquelas produzidas para suprir as necessidades do Reino. A diferença no padrão de cunhagem em seu valor nominal e intrínseco tinha o objetivo de evitar a evasão destas moedas para a Metrópole. A diferença forçava o uso das moedas somente na colônia. Vale lembrar que a cunhagem em ouro não sofria alteração, tanto para a Colônia quanto para a Metrópole.

Desde as primeiras moedas de cobre de D. Pedro II - cunhadas na Casa da Moeda do Porto (letra monetária PPPP); lavramento realizado para Angola, mandadas circular no Brasil pela Carta Régia de 10 de fevereiro de 1704 - foi criado um padrão de peso e diâmetro para os cobres brasileiros, o que durou até o reinado de D. Maria I, mais precisamente em 1799.


O padrão dos cobres do Brasil colonial se tornou obsoleto e pesado, sendo substituído por um novo padrão, com uma desvalorização de 50%. Uma das razões para a desvalorização era justificada pelo elevado preço da liga metálica utilizada. O Brasil não contava com minas de cobre em quantidade suficiente para produzir o suficiente para suprir as demandas de uma colônia em expansão, a solução, veio da importação, fazendo com que os preços dos discos fossem ainda mais elevados.

Diante do risco de ter uma quantidade de cobre no disco, maior do que o seu valor nominal, a decisão de reduzir o peso dos discos era vista como a melhor das opções.

Pouco antes da quebra do padrão, a oitava (3,5856 gramas) do cobre já era comercializada ao valor de 10 réis, valor visto como bastante defasado levando em consideração o custo das moedas para circulação cunhadas em cobre. Se considerarmos, por exemplo, a moeda de XL réis (40 réis) de peso 28,68 (oito oitavas), conclui-se que o valor de cobre (metal) contido nessa moeda correspondia ao dobro do seu valor declarado (nominal).

Se a oitava do cobre era negociada ao preço de 10 réis, podemos supor que uma moeda contendo oito oitavas deveria valer 80 réis e não apenas quarenta (XL réis). Mantendo o seu valor nominal (XL réis), e reduzindo seu peso à metade (14,34 gramas ou 4 oitavas), ao preço de 10 réis a oitava, a relação entre intrínseco e nominal passa a ter lógica, o que foi feito com a quebra do padrão monetário.

Apesar da diferença de peso entre os dois padrões (novo e antigo), as moedas circulavam nos seus valores faciais, na mesma época, apesar da diferença de pesos. Essa situação perdurou até a chegada da família real ao Brasil, época em que o príncipe regente D. João adotou medidas econômicas a fim de corrigir este, e outros, equívocos.

Em 1808, como consequência da expansão do domínio francês na Europa, o príncipe regente D. João, com toda sua corte, se instalou no Rio de Janeiro. O jovem soberano, precisando de muito dinheiro para fazer frente às despesas daqueles que o acompanhavam, adotou medidas econômicas a fim de disciplinar o uso de numerário em sua principal Colônia e contornar o problema da falta de dinheiro necessário à manutenção da corte. Uma dessas medidas consta do ALVARÁ de 18 de ABRIL de 1809, que ordenava a aplicação de uma contramarca em todas as moedas de cobre com data anterior a 1799, que estivessem ainda em circulação (as moedas do antigo padrão).


ALVARÁ de 18 de Abril de 1809.

Manda igualar o valor das moedas de prata e cobre que forem do mesmo peso e tamanho.

"...Eu o Principe Regente, faço saber aos que o presente Alvará com força de lei virem: que tendo consideração aos embaraços que nas transações sucessivas e quotidianas do comércio interno, podem ocorrer todas as vezes que girem moedas do mesmo metal, que, sendo de igual peso, têm contudo diversas denominações, ao mesmo passo, que, andando nas mãos de pessoas destituídas dos conhecimentos necessários, podem pelo estrago do tempo ocasionar duvidas para o futuro, e conduzir a exames que retardem a pronta circulação dos valores e produtos do trabalho geral: e querendo remover todos estes obstáculos; sou servido determinar: que marcadas a punção com o cunho das minhas Reais Armas, corram em qualquer parte do Estado do Brazil as seguintes moedas de prata e cobre, com os valores abaixo declarados, a saber: a moeda de cobre chamada antiga, cujo peso especifico é o duplo do da que se emittiu no anno de 1803, e valia 40 réis, passará a girar por 80 réis; semelhantemente a de 20 por 40 réis, e a de 10 por 20 réis; a moeda de prata de 600 réis passará a representar 640 réis; a de 300,320 réis; a de 150 réis; e a de 75, 80 réis; visto que o valor intrínseco das primeiras é o mesmo que o das segundas, com as quais igualam no tamanho, e só perdem a antecedente denominação a fim de facilitar a contagem de umas e outras, que continuarão a receber-se como dantes, enquanto não forem marcadas na fórma referida.

 E por que a moeda de 5 réis se faz indispensável para ajustamento de pequenas transações, e deve por esta causa conservar-se na circulação: hei por bem de ordenar: que a moeda nova de cobre, denominada de 10 réis, passe semelhantemente a ser marcada para ter o valor de 5 réis, e igualar-se com a antiga, correspondente em tamanho; continuando entretanto a receberem-se ambas, como vai declarado a respeito das outras moedas.

E este se cumprirá, como nele se contem. Pelo que mando à Mesa do Desembargo do Paço, e da Consciencia e Ordens; Presidente do meu Real Erario; Conselho da minha Real Fazenda; Regedor da Casa da Supplicação do Brazil; Governador da Relação da Bahia; Governadores e Capitães Generaes, e mais Governadores dos meus Dominios Ultramarinos; e a todos os Ministros de Justiça, e mais pessoas, a quem pertencer o conhecimento e execução deste Alvará, que o cumpram, e guardem, e façam cumprir, e guardar tão inteiramente, como nelle se contem, não obstante quaesquer leis, alvarás, regimentos, decretos, ou ordens em contrario, por que todos e todas hei por derogadas para este effeito sómente, como se dellas fizesse expressa e individual menção; ficando aliás sempre em seu vigor.

E este valerá como Carta passada pela Cancellaria, ainda que por ella não ha de passar, e que o seu effeito haja de durar mais de um anno, sem embargo da Ordenação em contrario: registrando-se em todos os logares, onde se costumam registrar semelhantes Alvarás...

Dado no Palacio do Rio de Janeiro em 18 de Abril de 1809.

PRINCIPE com guarda. Conde de Aguiar.

Alvará com força de lei, pelo qual Vossa Alteza Real ha por bem ordenar que em todo o Estado do Brazil e iguale o valor das moedas de prata e cobre, que forem do mesmo peso e tamanho, na fórma que nelle se declara. Para Vossa Alteza Real ver.

Joaquim Antonio Lopes da Costa o fez.


Assim marcadas, convencionou-se que essas moedas passariam a valer o dobro. Melhor dizendo, o inteiro sistema deveria ser homogeneizado tendo como padrão o custo do cobre, à época negociado por 10 réis a oitava (3,5856 gramas) de peso.

VALE LEMBRAR - O mesmo carimbo foi também aplicado nas moedas de prata da série “J”. Mas diferentemente daquilo que estava previsto para as moedas de cobre, nas moedas de prata, sua função era a de igualar as moedas de D. José (série J) ao padrão das patacas, então vigente.

Nascia assim o Carimbo de Escudo, conhecido entre os numismatas como Carimbo de Escudete. Segundo a determinação do Alvará, qualquer cobre anterior ao ano de 1799 deveria ser marcado, para que seu valor em relação ao peso fosse ajustado ao novo padrão, igualando-se a este.



Bibliografia: Maldonado, Rodrigo - Carimbo de Escudete, MBA Editores Associados.


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